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Não sei se é a perspectiva da ressureição
Mas falta-nos um desígnio no caminho em curso
Algum tipo de meta a cumprir no plano terreno
Tudo que vá para além da paragona estabelecida
A ideia de que a felicidade está no dinheiro e no poder
E no cumprir dos ciclos do nascimento, amadurecimento e morte
Sem esquecer o retorcido pensamento das orgias do desejo
A procura da felicidade no consumo e diversão
Mascaramos os valores com ideias dogmáticos
Os mitos que nos trazem os ancestrais
Provavelmente o engano institucionalizado no sacrifício
Precisamos sentir e reflectir sobre a essência da vida
Vivemos muito a queixa dos trambolhões
Não avançamos no elogio do que podemos alcançar
E como atingir a sublimação neste plano
São muitas comparações e dificuldades
O bom desta rota chamada vida é cumprir do passar de testemunho
A chama olímpica da existência passada através da vivência, da empatia e da memória
É breve este feixe de luz, mas a Humanidade repete-se
Somos apenas atletas a representar gerações
A esperança na própria perpetuação
De nada adianta a prepotência e a guerra
Não está ao nosso alcance perpetuar os anos
Esse é um dos mitos da moral religiosa
E da crença na dominação científica
Carregamos com os deuses no peito
Seria tão bom carregar com os mais necessitados às costas
Ou apenas nos braços ou conduzi-los pela mão
José Gomes Ferreira
Acredito no amor à primeira vista
Na sedução do olhar e das palavras
Na vibração energética que nos atravessa
E deixa os olhos arregalados de engasgo
Desconfio de paixões coladas instantaneamente
O impulso geralmente é construtivo
Mas no amor não é de fiar
A vida diz-nos que quem mais rapidamente se agarra, mais rapidamente se solta
Em tudo é necessário o instante
A catarse que faz vibrar ou é construída
A velocidade nem sempre significa reciprocidade
A autenticidade não resulta apenas do feixe de luz
José Gomes Ferreira
Falam mal de Abril e da democracia em construção
As elites perderam o prestígio da vénia e obediência
Nunca vão perdoar isso aos capitães
Agora são também eles reverentes
Primeiro assistiram ao regresso dos retornados
Sem dinheiro, mas com a ousadia de conquistar
Depois assistiram ao regresso dos emigrantes
Filhos e filhas tornaram-se professores e engenheiros
Muitos fugiram à sina única de ingressar na GNR
Mais tarde as universidades abriram mais as portas
A elite engoliu as novas profissões e ideias
No culminar da desgraça surgiu o rendimento mínimo
Cheio de defeitos, mas para a elite materializa o rancor e a perda
Alguém que vive sem trabalhar e recebe do Estado gera inveja
Outrora era cada um no seu canto
Somente esse grupo restrito possuía carro e telefone
O frigorífico chegou a muitas casas portuguesas com os cravos
O pobre ficava num canto da sala de aula
A mulher do agricultor não se misturava com flores de estufa
O agricultor perfazia aglomerados com outros homens simples
Muitos a cheirar a rebanho e ordenha
A mulher pobre ficava em casa, o homem na taberna
As famílias de vénia frequentavam o café Recanto ou Primavera
José Gomes Ferreira
Muitas vezes não adianta idolatrar heróis
Nem celebrar os seus feitos
As feridas da guerra não são promoções
Muitas vezes tão pouco são escolhas
Forte é quem resiste e luta pelos seus
Cobarde pode ser quem aceita cada missão sem questionar
Forte é quem chora e não se cala
O ícone patriótico só serve a história
Repousa nas narrativas de muitas páginas
Perdeu o crescimento dos filhos e o seu
José Gomes Ferreira
Vivemos cada vez mais fora de nós
E nada se deve a uma acusação de loucura
Mas à adesão silenciosa ao que é externo
Já não respiramos, aspiramos movidos por outros exemplos
Criámos um indivíduo espelhado no poente
Não tem orgulho na luta e construção
Reproduz inutilmente caminhos de glória
São sempre ideias de caminhos fáceis
Por vezes narrados no ânimo do drama da superação
A originalidade perdeu-se nos confins
É uma luta pelo poder e capital
A sedução do enriquecimento rápido
Lá diz o povo: trabalhar que é bom ninguém quer
O que importa é a representação do sucesso
O lugar do corpo na transigência da imagem
José Gomes Ferreira
Ventura e Salazar
Acordaram do mesmo lado
Um partiu para ficar
O outro é desenrascado
Resta a queda da cadeira
E o suspiro do animal
Política não é brincadeira
Nem é mero Carnaval
De que adianta resgatarem o passado
Se nos iludem com os valores
Na propaganda do que está ultrapassado
Acham-se grandes por serem conservadores
Queremos outro rumo
E o que seja melhor opção
Só não sopramos tanto fumo
Nem classificamos o fado da vida canção
De resto nada muda
A política são promessas
Se gritamos por ajuda
Andam de candeias às avessas
José Gomes Ferreira
Nem sempre os corpos transgridem
A moralidade é que salta o muro
Espreita pela janela em vigilância
Senta-se no banco da igreja em penitência
A moralidade transgride e é fedorenta
Domina as artes da perpetuação
Não aceita os bastidores
Exige centralidade no palco
Não é a performance que mata
É a moralidade que aperta o gatilho
Não é o orgasmo que é imundo
É a moralidade que se passa por perfeição
Não é o ciúme que mata e deixa marcas
É a moralidade que não respeita o coração
José Gomes Ferreira
Democracia e ditadura
São faces da existência
Uma acha-se já madura
A outra pede paciência
Repressão nao é lealdade
É poder em anos passados
Facilitismo não é democracia
É fazer o jeito a interessados
Para tudo é necessário equilíbrio
Sendo que nada se faz sem luta
Não adianta achar que tudo é martírio
E abdicar do gosto da disputa
Sabemos que nada cai do céu
E que os problemas são complexos
Pouco importa se a noiva usa véu
Precisamos manter os reflexos
José Gomes Ferreira
Tudo se compra na Internet
E tudo se vende online
Até o amor é moderno e digital
Basta carregar em compatível
Que chegam as compras trazidas à porta
Tudo parece maravilhoso
E no instante é saboroso
Ia agora mesmo pedir o jantar
O meu problema é que não troco o evento presencial
Também faço compras sem sair de casa
Mas eu gosto do prazer de sair de casa
Gosto de escolher a fruta e a carne
Percorro quilómetros até para comprar uma esferográfica
Não prescindo da escolha por observação
E do diagnóstico sensorial
Também não prescindo de ver gente
Nem do bom dia com voz humana
Nunca escolho caixas automáticas para pagar
Gosto que me perguntem se é débito ou crédito
É mais um posto de trabalho que se mantém
José Gomes Ferreira
Somos pó e natureza
Um ciclo passageiro
A vida é um sopro
Um orgasmo em 3 tempos
Nascemos, crescemos e envelhecemos
Depois não ficamos mais neste plano
De nada adiantam guerras e vaidades
De nós ficam apenas as sementes
Aquilo que se pode reproduzir após a nossa partida
A obra simbólica das lembranças
O exemplo de ser em plenitude
Também ficam bens materiais
Mas esses necessitam ser incorporados a ensinamentos
Se o fim último são esses bens não vamos deixar nenhuma herança
Deixaremos divisões que não conseguimos superar
Viva mais esse sopro da existência
É passageiro e fortuito
Dele não leva nada
Mas pode deixar o seu exemplo
José Gomes Ferreira
Fico mais um pouco
Se contares comigo as estrelas
Mas não te vás adiantar
Começo agora a contar
Fico até te cativares
E sentires o poder do universo
Só não te enganes
Hoje não vou chegar
Fico até recuperas o brilho
E escolheres a regra
Marcares o lugar
Na chegada da força que esperas
Nós dois temos muito em comum
Se a vida nos atinge
Sabemos como reagir
Vagueamos no espaço-tempo do fascínio
José Gomes Ferreira
Fico mais um pouco
Se contares comigo as estrelas
Mas não te vás adiantar
Começo agora a contar
Fico até te cativares
E sentires o poder do universo
Só não te enganes
Hoje não vou chegar
Fico até recuperas o brilho
E escolheres a regra
Marcares o lugar
Na chegada da força que esperas
Nós dois temos muito em comum
Se a vida nos atinge
Sabemos como reagir
Vagueamos no espaço-tempo do fascínio
Pois se é essa a luz do espaço
Que acabe com a escuridão
Que não seja apenas brilho
Mas aponte novo caminho
José Gomes Ferreira
Não tem paixão sem água a correr
Nem desejo sem paz no coração
Porque se desejo é corpo de mulher
Paixão é a possibilidade do amor acontecer
O coração sempre se inquieta
No receio do que possa sentir
Quer ser autónomo e ter uma meta
Tem pavor a quem gosta de mentir
Desejo é a justiça da carne
Que é sempre o alvo da moral
A culpa é de muito alarme
Que do peito mostra o cabedal
Dizem que é afinidade
Também dizer ser química
Podem ser valores de verdade
E os lábios na sua mímica
José Gomes Ferreira
Tem água fresca no poço
Onde penduro um pequeno garrafão
O vinho humedecerá as gargantas
E o canto pode seguir-se a uma recordação
Um redemoinho leva pó e folhas soltas
Faz girar panos e plásticos de cobertura
O vento suão traz uma corrente de calor
Escutam-se os pássaros na circunstância
Chego a colocar alguns costilos ao fundo do terreno
Agarro algumas bichas do milho numa lata
Uso-as como isco para os tralhões
As canas do milho foram cortadas e amontoadas pela manhã
A palha está áspera, uso o regador para a amaciar
As mulheres aglomeram-se em redor do amontoado
Na família e vizinhança tem sobretudo mulheres
Um ou outro idoso participa da descasca
Sou eu que despejo os baldes e sirvo algo para beber
Sou eu que carrego os sacos cheios de espigas
Subitamente o alvoroço, alguém encontrou uma espiga vermelha
Segue a tradição, vai de roda com beijos e abraços
Assim seguimos de monte em monte
Mesmo com o Sol já posto na luz que fecha o dia
José Gomes Ferreira
* São sobretudo memórias, mas ainda se produz milho, sempre que estou na terra ajudo, mesmo sendo reduzida a produção. Algumas palavras só quem conhece a vida no campo as conhece. Tralhões ou taralhões são pequenas aves. Costilos são armadilhas para as apanhar usando como iscobich"bichas" do milho.
Esperei até hoje uma carta tua
Capaz de conter alguma explicação
Porém no amor o que conta é a escolha
Cada um tem que seguir o seu caminho
E de que adianta entender
Se o tempo hoje é outro
Modificou-se todo sentimento
E não se cruza mais a razão
Não guardo rancor ou ternura
Muito menos querer
A mágoa só a nós dói
Não adianta cismar e insistir
Não adianta desmerecer
Nem soprar qualquer maldade
O tempo é fiel companheiro
Mais do que eu será capaz de perdoar
José Gomes Ferreira
Meu querido mês de Agosto, de tantas lembranças e desejos
Sei que estás para chegar e ainda não me preparei
Este ano não poderei ir aos bailes nas aldeias
Também não vou ver o Tony Carreira
Nem os políticos a saltar de alegria
Não vou conseguir integrar o regresso dos emigrantes
Faz muito tempo que não vejo o Sud Express cheio deles
Não ficarei à conversa nas tuas noites longas
A famosa sesta após almoço terá de ser adiada
São tantos os abraços que ficam em falta
Gostava tanto de ti no meu tempo de adolescente
Trazias chocolates e roupa nova
Trazias temporariamente os meus pais
Geravas deliciosas espigas no milho verde
As uvas ganhavam pintor e ficavam maduras
O próprio milho seguia dos lameiros para as lajes
Figueiras, pessegueiros e pereiras carregavam de fruta
As batatas eram retiradas da terra e davam lugar à couve portuguesa
Tenho tantas saudades tuas, do som das cigarras e dos grilos
Das noites estreladas e do pensamento desprendido
José Gomes Ferreira
Precisamos sair da nossa terra
Para conhecer o seu valor
Antes disso é apenas a serra
A proximidade não gera amor
Não tem limite a distância
E a capacidade de observação
Permite dar relevância
Ao que não sai do coração
A vizinhança não cega
Mas não destaca os valores
O que é rotina sossega
Não revela todos os factores
José Gomes Ferreira
Faço versos para compor o meu coração
Faço versos para realmente imaginar
Quem sabe existe privilégio na solidão
E nas palavras se descobre como amar
Faço versos a imitar uma canção
Eu que não sei nem de trautear
Sonho com uma interpretação
Modero os lábios como para beijar
Escrevo de improviso sem demora
Relato o percurso e o momento
Deixo uma imagem não sonora
Acredito no amor como sentimento
José Gomes Ferreira
* Isso de acreditar no amor tem muito que se lhe diga, refiro-me no sentido lato.
Ao longe as figuras magistrais
O plano que desliza na superfície
O espectro de veneração
O culto no apaziguar da alma
A paisagem contemplativa dos anos
Nas águas o meu rosto
O espelho do coração
A imaginação trazida nos reflexos
O turbilhão de pensamentos
Todas as viagens em instantes
A reverência ao Sol e à luz
De perto o teu rosto
A tua forma e energia radiante
Os motivos de atenção
A sensibilidade na observação
O aroma colorido das flores
A paz retumbante do sorriso
José Gomes Ferreira
Trazem luz e cor
Barraquinhas de petiscos
Stands de exposição
Levam pessoas das aldeias
Emigrantes e viajantes
Parentes e apaixonados
Algumas cheiram a sardinha assada
Outras mostram adubos e tractores
As festas de verão chegam a todos os lugares
Algumas são livres, são para o povo se divertir
Nas outras a bilheteira é quem manda
Ainda assim o que mais marca não é a cor da pulseira
Mas os ritmos dos artistas escolhidos
Tem os grandes festivais, que escolhem artistas de outra fama
Raramente se repetem as festas para dançar
Querem artistas para fazer bater o coração
Chamam famosos da televisão
Nem todos sabem cantar como o povo gosto
As festas nas aldeias eram as mais aguardadas
O amor poderia acontecer nas escolhas da noite
Slow agora não é nada, outrora era balada
Corpos colados e olhos fixos a esconder a multidão
E o Verão de calor intenso a pedir um brinde
José Gomes Ferreira
* Da tipologia do meu querido mês de Agosto e das saudades dessas vivências.
Deixa a cabra solta
Vem para casa jantar
Provavelmente ela dá uma volta
Descansa, já a vais à amarrar
Deixa o Sol se pôr
Que o dia chega ao fim
As horas foram de labor
Guarda para o sono o teu latim
Deixa esconder as montanhas
As ribeiras e os pinhais
Repara nas ovelhas prenhas
Vai cuidar dos animais
Deixa de apenas recordar
E dar alegria ao coração
Lembra-te também de realçar
Como tudo em nós é paixão
José Gomes Ferreira
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