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O amor é o sonho eterno das virtudes
O estremecer da pele e o encolher da barriga
A idealização dos sentimentos
Mesmo que as relações não se superem ou atrapalhem
O amor é a estética da paixão
O gosto pelo desejo e pelo assunto da reciprocidade
É o elo que une os pensamentos
Por vezes segue a pragmática das relações
Trazido pelas formas e valores
Outras vezes supera-se no verso perpétuo
Pois o amor não é o trato da rotina
O amor é o próprio verso
A sensualidade levada das ideias ao coração
José Gomes Ferreira
O caminho é por vezes longo
O temporal ameaça a progressão
Raios e trovões agem sincopados
O horizonte estremece com a alma
Importa não perder o rumo
A fé é a esperança de quem não desiste
A solidão da noite é a crença reforçada
Nada acontece por mero assobio
A magia está na superação e altruísmo
Nada é adquirido quando o coração se dispõe e a razão o acompanha
Não é o conformismo que mobiliza recursos
É o gosto pela travessia e as virtudes aprendidas
José Gomes Ferreira
Encosta abaixo os aromas arrepiam as lembranças
O rosmaninho e o alecrim trazem também colorido ao olhar
Tal como o Sol que projectar a vida para a foz
O céu azul completo satisfaz o quadro
A terra cheira ainda a chuva verde com pétalas floridas
O olhar perde-se na diversidade de focos e vibrações
Dos sulcos corre ainda água pura para o rio
O granito é abraçado e ao mesmo tempo superado
É despido pelo vento e pela chuva e vestido pela intensidade da vegetação
Borboletas e lagartixas mexem-se no paradoxo
Aumentam a beleza do quadro pintado
Assim como os pássaros que preenchem o som até às serras
A alma viaja e ilumina-se no recorte da perspectiva
A marca dos sapatos diz que estivemos ali
E levámos brilho nos olhos e gratidão na contemplação
José Gomes Ferreira
* A imagem de outros anos é das encostas/margens do Mondego.
Liberdade não é aquilo que eu quero
Mas o que me é permitido querer
E a minha tenacidade para o alcançar
Liberdade não é para idolatrar egos
É para construir laços e reforçar pontes
Liberdade não é um produto de consumo
A carne de porco vende-se no talho
Liberdade conquista-se na praça
Liberdade conquista-se através do diálogo e do silêncio
Liberdade não é o alvoroço das elites
É um acto de humildade e inteligência
Não é a minha narrativa sobre o cruzar da história
Liberdade é o meu respeito pelo outro na reverência assumida como desejo colectivo
José Gomes Ferreira
Corro para flutuar entre as construções
Como recíproco na imagem das escolhas
E inspiração no que vai para além do peito
Sem que o coração deixe de ser o motivo
Não é a corrida o mais importante
Ainda que o corpo possa declinar
É o caminho e os laços
Tudo que posso observar e aprender
O meu trajecto não é para glória
Pelo menos no exaltar da posse
É o repartir do brilho que me dá coragem
E reforça cada motivo do andamento
José Gomes Ferreira
Todo o poema tem o seu guarda-chuva
E toma o seu banho de espuma
Todo o poema deixa cair a sua lágrima
E mostra o sorriso da alma
Tudo porque o poema é grito e paixão
Todo o poema é fantasia e vida
Observação e vivência do caminho
Todo poema é nuvem e imaginação
Tal como todo o poema é real
José Gomes Ferreira
Se te envio as minhas palavras
Não o faço inutilmente
Já comuniquei ao coração
E chamei as estrelas para colaborarem
Não sou solitário em desespero por reciprocidade
Nem escondo o meu querer
Só que nada deve ser adiado nas intenções
Nem contar com vantagens infundadas
Toda a promessa sem repercussão é uma ofensa
Se a sorte não se fizer nada muda
Todo o pressuposto também nos acompanha
Necessitamos de ser dignos dos actos idealizados
José Gomes Ferreira
Tem escravos da mente
Na liberdade que pensam ter
Tem quem seja indiferente
E quem não queira saber
O meu sincero aplauso
A quem mantém a confiança
No meio de tanto ser falso
Deve-se reforçar cada aliança
Alegre é quem paga as contas
E tem um ombro amigo
Corta o cabelo pelas pontas
Sem saudades do antigo
Falam muito em valores
E na importância da verdade
Para logo largarem os pudores
E fingirem a relação ser amizade
José Gomes Ferreira
Se a noite é mais bela
Concentrando as estrelas
Vou espreitar-te à janela
E chamar-te entre as donzelas
Se na noite tanto te quero
E separo o que é ilusão
É porque o sentimento é sincero
E vem do interior do coração
Se a noite é rainha
E o amor constante
Quero sentir-te minha
E acariciar-te mesmo distante
José Gomes Ferreira
Para o poeta o amor é a luz contida no poema e a inspiração da felicidade recíproca
Para o conservador amor é a assinatura de um documento, a reprodução familiar e a obediência
Para o progressista amor é a liberdade de usar o corpo
Para o político amor é como o Estado intervém na vida privada
Para o padre amor é casamento, é sagrado com excepções familiares
Para o homem amor (ainda) é a disponibilidade da mulher para sexo
Para a mulher amor é casar com véu e grinalda e acreditar num homem fiel
Para a sociedade amor reduz-se ao vínculo relacional, que é quem legítima a vida social
Para o alcoólatra amor é a companhia da bebida
Para o sóbrio amor é a lucidez dos dias e a partilha da noite
Para os filhos amor é a preferência dos pais
Para os pais amor é amar-se a si por extensão
José Gomes Ferreira
Glorifico os dias com dedicação
E com a leveza que deixo no entendimento
Não procuro exibição ou escrutínio
Apenas o deleite nas horas cumpridas
E no gosto pela aprendizagem recíproca
Prefiro visitar as ruas que as assembleias
Sou anónimo na moldura heterogénea
Deixo o rosto brilhar sem interrupção
Os olhos relampejam como abraços
Tem quem siga indiferente ao meu espírito
Tem quem dê troco ao meu olhar
Haverá talvez alguém a ler o silêncio e a sedução
Já eu sorrio com a alma reservada
Não me escondo, somente me protejo da mudança da hora
Observo, observo com a limpidez da subtileza
Talvez até nem notem que estou ali
Apesar de denunciado pelas formas do corpo
Não preciso de espreitar no parapeito da janela
Mostro-me na calçada e onde me possam imaginar
José Gomes Ferreira
Não gosto de chamar amor ao amor
A repetição do enunciado confunde o trato
E muitas vezes é uma declaração para ser notada
Se o amor é Maria esse deve ser o nome do carinho
O gesto para chamar sem fantasia
Gosto do amor que não solta a mão
Que não se acanha em público
E revela os laços que chegam ao coração
Não gosto do amor que reage aos mirones
Isso não é amor
É imitação de título de prioridade
Gosto do amor que sorri com os olhos e lábios
Só os amores perfeitos o conseguem
Não usam cobranças ou narrativas
Atingem o cosmos no parafrasear da alma
José Gomes Ferreira
Gosto da luz do Sol e do céu azul pleno
De muito brilho estampado no rosto
Do burburinho de gente
E dos aromas de fragrância esculpida
Alguns com cheiro a flor e perfume
Outros com o cheiro a comida no tacho
Assim como do colorido que aproxima os beijos
E do bâton riscado nos espelhos
Sou diurno até no amor que desejo
E no encanto trazido pela natureza
Porém a noite é viagem, a noite é poesia
Junta os amantes e reúne as famílias
Relembra narrativas e mergulha nas escolhas
A noite é a âncora recolhida do pescador
O momento de largada e contemplação
A noite é abrigo e vela acesa pela memória
A noite é agradecimento e repouso
José Gomes Ferreira
O sorriso é a chave da felicidade
A expressão do que vai na alma
A voz do coração em imagens
A portabilidade da memória
A linguagem de quem domina as palavras
O código para encantar os seres mais puros
O sorriso é a surpresa das violetas
A magia pura de quem comunica
A mensagem certa para o receptor
O diálogo recíproco de seres de luz
José Gomes Ferreira
Querem definir os padrões
A hora de deitar e dormir
O chá das 4 e os biscoitos
Tal como a reza de joelhos
A posição de defecar
Os beijos escondidos entre árvores
A roupa para efectivamente lavar
A hora e utilidade do sexo
Assim como a vontade do sono
E as compras do mês e o tempo
Querem mostrar as páginas da Bíblia
E a veneração optimista dos deuses
Como se desenvolvimento fosse pedir perdão
E as pancadas no peito fossem por respeito
Querem escolher o passado e a nostalgia
Juntam-se em repasto misturado de WhatsApp
Acreditam na salva e nas bênçãos
Seguem o caminho que mais lhe convém
José Gomes Ferreira
Se é certo que os movimentos ditos progressistas vão rapidamente "da lama ao caos", parafraseando o título do álbum da Nação Zumbi de Chico Science, os movimentos conservadores vão do neoliberalismo de orelha à canção do Anjo Silvestre enquanto o Diabo esfrega um olho. Fazer crer que os problemas do desenvolvimento estão nos valores da família, na homossexualidade, transsexualidade, aborto, eutanásia e nas comichões da modernidade é pior que fazer acreditar no Pai Natal.
O problema nunca foi apenas de crise da família, a crise dogmática é tão desperante quanto a económica e ambiental. E na ausência de resposta os ataques são sempre idênticos. Ataca-se o desvio a certos valores, questiona-se o papel da escola, levanta-se a hipótese de fazer regressar o serviço militar obrigatório e tantas outras coisas que nos iludem com a real dimensão e espectro do problema. Ao mesmo tempo atacam o estado. É impressionante o salvo conduto que alguns simpatizantes, mas particularmente o FMI, dá ao despedimento de trabalhadores e medidas similares na Argentina. É certo que a esquerda se ilude que haverá sempre dinheiro para tudo, mas a ideia de que com menos estado se melhora a eficácia, eficiência e efectividade das políticas públicas é uma utopia que apenas gera estes ciclos de "agora governas tu, depois governo eu". O que é mais curioso é que os mesmos apoiantes batem o pé quando o estado falha na sua acção no contexto de proximidade. Para tudo é necessário equilíbrio.
Voltando ao tema que me trouxe aqui, abomino esta ideia de que políticos influentes venham defender determinado estatuto moral para a sociedade. Lembra a Revolução Chinesa, tal como lembra os órgãos iranianos com atribuições religiosas infiltrados no estado. Não se trata aqui de defender ou rejeitar determinada posição. Por exemplo, sou claramente favorável à eutanásia, mas de forma mais moderada do que o previsto na lei (que está em banho Maria) e por dois motivos fundamentais: i) necessidade de garantir cuidados paliativos a quem necessita e apoio incondicional aos cuidadores; ii) a lei resvala para cenários de suicídio assistido que merecem a minha oposição. O grande problema não está na opção eutanásia, mas que outras opções concretas estão a ser aplicadas.
A questão está em definir o que está em jogo nesse crise da família através da identificação e enfrentar das causas. Quando se trata de aliviar o número de horas de trabalho ou aumentar os ordenados escutamos as mesmas pessoas a dizerem: antes é que era, agora ninguém quer trabalhar.
Infelizmente muitas políticas de apoio às famílias são um fiasco. Acho impressionante quando determinado município anuncia determinado valor como subsídio de apoio à maternidade. Curiosamente ou não, são municípios do interior, desertificados, sem oferta de emprego qualificado, com as escolas distantes, sem creches, sem transporte público, com os estabelecimentos de saúde distantes ou com horário de escritório. Mas também sem oferta cultural e desportiva, etc etc. Ou seja, pedimos crianças sem nada para oferecer.
Os valores que este grupo defende, e com toda a legitimidade, é fantástico para vender bíblias, não é por certo uma saída do pântano e do atraso que aceitamos com resignação ou com mero interesse ideológico. O bom mesmo é identificar prioridades e avançar com certezas e homens e mulheres que se destaquem sem pedirem às televisões o reconhecimento por dizerem umas coisas. As bíblias não enchem o prato de comida e não pagam a renda.
A água corria como pão
Tenra e luzidia aos olhos
Capaz de curvar elegantemente o traçado
E deixar um aroma repleto de vida
O espelho límpido impressionava
Beliscava as quelhas de cultivo
Permitia um olhar cara a cara
Em cada rego havia uma fuga destemida
Pelo mês de Abril os poços enchiam
E os lameiros atolavam os mais incautos
Das nascentes brotava fertilidade
Valia a pena esperar e ver o tempo aquecer
Os torrões ainda inteiros desfaziam-se
Da sementeira brotavam novas plantas
O ciclo completava-se em seguida na rega
Poderia ser manual aquele dar de beber à terra
Um velho cabaço sentia as mãos calejadas
Em poucas semanas o feijão fazia-se alimento
O milho ficava pronto a recolher e chegar à eira
Na carroça seguiam algumas espigas soltas, feijão verde e milhem
A esperança era que cada ano fosse melhor
E a colheita fosse o sorriso perpétuo de gente pura
José Gomes Ferreira
* milhem parece ser um regionalismo, é um tipo de erva que, como o nome quase indica, cresce no meio do milho. Apanhada na fase de crescimento é um petisco para os coelhos, até as galinhas a depenicam.
Esses que muito gostam de Salazar
Não sabem o que é limpar o cu a uma folha de videira
Não sabem que idolatrar fascistas dá azar
E que no 25 de Abril dá caganeira
Reclamam da liberdade e das posses
E das vantagens retiradas da democracia
Adoram a vassalagem aos bosses
Ainda tem quem lhe chame meritocracia
Andam com os olhos revirados
E graves problemas nas orbitais
Defendem um patrono para ficarem descansados
Mas nada fizeram na defesa de outros carnavais
Dizem que é para combater a corrupção
Mostram-se preocupados com a insegurança
Outrora recebiam favores em mão
Aplaudiam a elite que enchia a pança
José Gomes Ferreira
Um galo canta no sovaco da madrugada
Enquanto a esperança tarda em aparecer
Sonhei na noite que te acariciava
E a loucura era tudo de bom acontecer
A espera e a voz sobem a temperatura
Mostrando a beleza do caminho percorrido
Haverá sempre lembrança que perdura
E o olhar fixo na imagem do já vivido
Paramos no tempo e na espera
Rejeitando ainda assim qualquer repetição
O orgulho transforma gato manso em fera
Retirando da história quanto emoção
Se eu não tivesse chegado na cidade
Não saberia que escolha seria certa
Nunca na intenção amamos de verdade
É necessário que o coração seja uma porta aberta
José Gomes Ferreira
Poderiam chamar-me de o menino que ia levar os animais a pastar
Pois foi assim nos primeiros anos e mais tarde na adolescência
Escapava às pedras escorregadias por manhãs de nevoeiro
Também arredava pé dos lameiros mergulhados nas águas de inverno
Preferia as encostas e o verde dos socalcos
Seguia fascinado o rebanho de ovelhas, não fosse alguma escapar
Acompanhava feliz da vida a ida para o pasto e lá ficava o dia inteiro
O queijado tinha sido cortado à minha medida
Media pouco mais de meio metro, servia para fazer sinais
O que mais me fascinava era a descoberta de novos lugares
Aqueles caminhos eram em outro lugar do planeta
Ainda que tudo tudo fosse perto, era um novo mundo aos meus olhos
A minha avó acompanhava-me com o saber disciplinador
E lá seguia eu como quem aprendia a viver
José Gomes Ferreira
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